O ALTEREGO

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O ALTEREGO 

MANUAL DE APOIO 

(ANTEPROJETO) 


CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES -

  Cada indivíduo, mesmo o alienado de carteirinha  GIR/IFP, dispõe de uma personalidade step, o chamado Alterego, ao qual o caráter autônomo autoriza transitar com igual escantilhão comportamental do Ego, sem restrição.

   Pesquisada a crescente valorização do fenômeno alterego (alter) no século XXI, particularmente na Turma72, restou patente o imperativo inadiável de serem popularizados aspectos e noções de convivência envolvendo as diferentes instâncias psicológicas (psi), intra e interpessoais da afamada tribo castrense. Eis a destinação prioritária deste Anteprojeto de  Manual.


CONCEITOS  FUNDAMENTAIS

EGO –  Instância  notória da personalidade, responsável direta pelo comportamento humano, a parte explícita do Ser perante os semelhantes e  si próprio. Sinônimo: Eu.

ALTEREGO – Ego alternativo, ou ego step,  sempre ao nosso lado e ao  inteiro dispor, apesar de oculto e frequentemente ignorado pela maioria dos mortais. De visceral importância ao primado da sinceridade, é incorpóreo. Sinônimo: Outro Eu.

CONFLITO DO EGO – Disfunção caracterizada pela indistinção do verdadeiro Ego. Muito observado em soldados-bacharéis, ou bacharéis-soldados, via de regra indecisos perante a prevalência do pólo de dualidade profissional  a ser manifesto.   

CONSISTÊNCIA DO EGO – Expressa a estabilidade temporal das convicções pessoais. Ilustrada pelos que jamais trocaram de time, e sobretudo  de mulher do coração. Jamais confundir com cabeça-durismo ou teimosia, corolários reprováveis.

EGÓLATRA –  Partidário, cultor  habitual da egolatria.

EGOLATRIA – Adoração excessiva do ego, autossuficiência patológica e insuportável,  também conhecida como Síndrome do Eu me Acho. Geralmente atinge jovens FEs, recém aprovados na ECEME, integrantes dos QAM nos estágios superiores da carreira, bacharéis-soldados e consultores em amenidades.

EGOTRIP – Viagem prazerosa pelos desvãos do inconsciente, expressa na verbalização de sonhos adormecidos. Popularizada pelos antigos ripongas  psicodélicos do Flower Power, viceja nas tardes oníricas do CMPV, onde rapazes eufóricos proclamam sem culpa e sem medo fantasiosas menções MB, saltos aeroterrestres fantásticos e prêmios de melhor  cavaleiro acadêmico.   

EGOTRIPPER – Viajante de egotrip, quando abrigado sob o portal mágico da Praia Vermelha. Embusteiro, megalômano ou mentiroso, quando fora dali. Sinônimo: Sonhador.

LOGORRÉIA – Compulsão discursiva para proferir incontrolável torrente de abobrinhas. Exclusiva no formato oral, tem no Boca o seu czar, embora possa contagiar alteregos insuspeitos.  Mais aguda,  duradoura e patológica, porém menos abrangente que o bostejo, verbal ou escrito. 

PERSONA – Raiz psi da imagem, individual ou institucional. Ao contrário do que muitos pensam, não foi invenção do mago Hitchcock. Objeto supremo da faina marqueteira, nos tempos modernos adquiriu valor místico para socialites, celebridades BBB, mercado empresarial, políticos, mensaleiros, impostores, peladeiros, fauna artística e afins.  

RADICAL DA OBJETIVIDADE – Incapaz congênito para perceber a diversidade enriquecedora da condição humana. Xiita inflexível da razão pura, abomina filósofos, pensadores, poetas, digressores, logorréicos e bostejadores. Original Idiota da Objetividade, na etimologia nelsonrodriguiana, a presente expressão light  visa a facilitar-lhe a compreensão devida de suas percepções restritivamente obscuras. 

SUPEREGO – Instância psi controladora das pulsões primárias, ou instintos. Exerce papel crucial na pasteurização das atuais relações sociais, via a hipocrisia do politicamente correto. Evita Dom Obá III invocar entidades afro-tribais furibundas quando fustigado, ou confrade empolgado, distraído e overjoyed oscular a boca do Boca numa sexta-feira festiva. Sinônimo: Supereu.


DEVERES E DIREITOS DO ALTEREGO

  1. São deveres do Alterego:
    1. Apreender com maestria as preferências, características, idiossincrasias, espúrias e taras diversas inclusas, desejos inconfessos, broncas pessoais, traumas de infância, culpas, atos heróicos e hediondos, idolatrias, paixões esportivas, planos vingativos, inquietações, fantasias romântico-sexuais, senhas de acesso à conta bancária sigilosa e poupança, agenda telefônica, mapa astral, romances, frustrações pendentes de solução, safadezas dissimuladas, gostos culinários, maquinações sin istróides em gerale demais minudências do Ego.    
    2. Respeitar  a intimidade e os sentimentos do Eu. Sempre ter em mente representar aquilo que ele, tolhido pelo Supereu castrador, jamais divulgaria ao mundo, receoso de admoestações, sanções e reprimendas severas.
    3. Proteger o Ego de retaliações, vinganças, mandingas, processos, emboscadas, ações judiciais e correlatas, valendo-se da imunidade opinativa advinda da inimputabilidade legal de sua conduta.
    4. Conhecer e reverberar  com  franqueza alarmante, sendo inimputável, os xingamentos, solapas, desabafos solertes e a vastidão de possíveis delitos de opinião do Ego, capazes de conduzi-lo às barras dos tribunais.
    5. Burlar com engenho e arte o ofício do Superego, impedindo-o de controlar o Eu em suas manifestações mais autênticas.
    6. Cooperar para elevar a autoestima e o prestígio social do Ego, manifestando-se com propriedade e correção em público, notadamente nas ocasiões em que pressentir iminente derrapada do preceptor.   


  1.  São direitos do Outro Eu:
    1. Expressar-se sem autorização do Eu, sem falsa modéstia e na plenitude de suas aptidões irreconhecidas.
    2. Falar, escrever e realizar tudo que o Eu gostaria de assumir e refuga.
    3. Ser existencialmente incorreto.
    4. Azucrinar a cabeça do Superego.
    5. Inimputabilidade ampla, geral e irrestrita, não podendo ser alcançado, o Ego menos ainda, pela mão implacável da Justiça, inclusive a do Juízo Final.
    6. Imaterialidade existencial, que associada à inimputabilidade o isenta da morbidez de tocaias insanas.
    7. Triplex na orla de Ipanema, mansão em Búzios, flat no West Upper Side, apê na Rive Gauche, bangalô no Turano e cafofo no Alto Babilônia.
    8. Discografia completa de Wilson Batista, Mário Reis, Orlando Silva, Djalma Ferreira, Luiz Antônio, Billie, Ella, Sarah, Bird, Cole Porter, Gershwin, Sinatra, Miles Davis, Chet Baker, Bossa Nova, Sambalanço, Nelson Cavaquinho, Tom, Noel e Pixinguinha.
    9. Filmografia completa de Carlitos, Hollywood anos 30 a 50 e a  Nouvelle Vague inteira.
    10. Tocar sax na Orquestra Tabajara, aprovação no draft da NBA, presidir o Gigante da Colina.


                                                      COMENTÁRIOS ADICIONAIS

   O Alter, antes de tudo, é um forte. Saiu do armário sob incentivo do Dr Sig Freud, neuropsiquiatra terceirizado do SUS durante décadas morador na animada cabeça de porco da  Rua Berggasse 19, próxima aos Arcos da Lapa, e de lá botou o pé no mundo. Teve de suas manifestações mais extravagantes na figura alternativa de Madame Satã, metade do ano feroz operário MMA,  metade seguinte fervoroso entubador  de palmeiras do Mangue.      

    Dr Jekyll e Mr Hyde, Dorian Gray e Brás Cubas, alteregos de selecionadas safras literárias universais,  exprimem à perfeição a dualidade intrínseca aos seres humanos, provocadora de  sobressaltos aterradores na lógica perceptiva das afetividades vizinhas.  Basta observar a conduta alternante senoidal de estimados confrades a se comprovar a tese do Outro Eu Absoluto. Aqui, simultâneos, guerreiros e poetas; ali, combatentes e profetas; acolá, confessores e predadores; adiante, cientistas e piadistas, num oceano de paradoxos individuais a confundir mais do que esclarecer a vã psicologia claudicante.          

   No seio, perdão, da veneranda Turma, Bac do Milênio e Bac do São Jorge espelham a extraordinária antítese  médico e monstro das profundezas da natureza humana. Enquanto o primeiro seduz pelas análises sóbrias, elegantes e pertinentes, embora o ranço tricolor, o segundo, após brevíssima aparição desastrada, recolhe- se a silêncio sepulcral, consequente de fanfarronices exacerbadas diametralmente opostas à aparente sensatez de Bac do Milênio.   Arataquinha, pqd ex- atleta, Barão Vargem Grande eminente poeta;  Boca, falador, Ismael ouvidor; Barcellos, às da Infantaria, Boita, perú de Cavalaria; Salvany vibrador, Dame rran pensador; Cléo, vate pé-sujo, Saint-Clair homem culto; Ivan, framenguista, Dom Coco, multiartista; Dr Peres, bacharel, Peres Cobra, skynalha do céu, são retratos aleatórios da infindável gama de inenarráveis clássicos psis, Egos vs Alteregos.    

 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS

   Além de fortes, os Alteregos são conceitualmente irresponsáveis, imprevisíveis, brincalhões e descompromissados com a realidade lógico-factual. Por definição incorpóreos e inimputáveis, têm licença para navegar no domínio da pura metafísica, sem de todo desvencilhar-se das garras do Supereu, que os marca homem a homem. Ariscos, dribladores e provocativos, ocupam faixa intermediária de conduta, localizada entre as porralouquices épico-vanguardistas de um certo Capitão Garance e a rigidez perceptiva dos Radicais da Objetividade. 

   Egos, de per si, podem gerar número indeterminado de Alteregos, mandando o bom senso limitá-los a três, conforme relatórios de pesquisas validadas. Exemplifique-se o Ego Dom B, que ao cadastrar o quarto Outro Eu, o nefando Bac do São Jorge, teve o desprazer de vir a público amenizar lambança virtual do replicante excedente. Reza a popular sabedoria minimalista que o Alter é igual mulher: less is more, i.e, se um (a) já dá trabalho, imagine dois (duas), ou mais.                   

  Este anteprojeto de manual, minutos de sensaboria, bula, estatuto, script besteirol ou livreto burlesco, submete-se a elogios, espontâneos e comerciais, críticas, correções, supressões, adições, menosprezos, apagões e deleções, parciais ou completas. Na verdade, só pretende sustentar que o Alter, Phd na onda  do vaivém, também é um rapaz de bem...

Rio, 06 de setembro de 2012

Dom Obá III, resignado, realizado e risonho com a  vidinha de Alterego profissional.{jcomments on}