REUNIÃO NA AMAN

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             Estou convicto de que um dos melhores momentos de grande  felicidade, emoção  e fruição existencial nesta minha efêmera vida foi no inesquecível reencontro com velhos camaradas e amigos de minha querida turma MMM em Fortaleza, queridas, valorosas e saudosas pessoas que nunca hei de olvidar em meus pensamentos e preces.

           Hoje, inspirado pela atual torrente de profundos, poéticos  e filosóficos textos  de meu irmão cósmico e de arma, Nilo, em particular pelo recente “Uma razão de viver”, quando lamenta  e justifica brilhantemente seu atraso à última reunião no CMPV,  resolvi expor  também meus irredutíveis  motivos de nunca ter  comparecido às reuniões de nossa turma na AMAN, nem na EsPCEx.

           Quando nossa coesa turma se reuniu na AMAN pela primeira vez em 1982,  pelos 10 anos, não fui. Eu servia bem pertinho, no Rio de Janeiro, no glorioso Regimento Andrade Neves, no posto de Capitão, logo após cursar a EsAO.  Naquela época,  já havia ido à AMAN por várias vezes, a serviço ou por competições, desde o  tempo  que servira por 3 anos como Aspira/Tenente no valoroso  3ºRCC ( Ferro & Aço! Fogo & Balaço!), lá no velho Realengo.

       Isto porque, infalivelmente,  todas às vezes que cruzei o portão monumental da AMAN  senti-me  desconfortável, ansioso, inquieto, perturbado  e louco  para sair dos limites acadêmicos. Com certeza, pela teoria freudiana,  explica-se estes óbvios  sintomas neurastênicos, normalmente frutos de  manifesto  trauma psíquico, tipo neurose de guerra.

           Assim, no  passar dos anos, auxiliado por  Freud,  firmei convicção de que muitos  jovens, como eu,  que passaram por severos internatos tipo ExPCEx e AMAN carregam para sempre traumas psíquicos  resistentes e dolorosos, advindos do permanente  tratamento frio, distante, ríspido  e impessoal  de seus instrutores e comandantes, num momento difícil de rompimento do cordão umbilical amoroso desses jovens com  seus pais e familiares. Muitos, não suportando o terrível  afastamento familiar,  pedem para sair. Outros, por não aguentarem o cruciante e sagrado ritual de passagem do estado mental  civil para o militar. Se não me engano, dos 170 que entraram na EsPCEx em 1966, apenas 60  superaram as agruras, asperezas, a carência afetiva  e ousaram prosseguir na desafiadora  formação castrense na AMAN. Sem dúvidas, no instante que todos aqueles tenazes 60 preposos  cruzaram o portão monumental da AMAN, em 1969,  já haviam se  convertido  em autênticos militares de têmpera de aço, soldados na plenitude  e guerreiros ad aeternun.

        Na AMAN, novo choque existencial, novo trauma libidinal familiar, novo ritual de passagem radical, onde diferentes jovens de diversas origens, maturidade e formação são indistintamente jogados na vala comum de abjetos “ bichos”. Foi um cruel tratamento igual para os claramente desiguais, que chocou profundamente aos  veteranos  guerreiros  preposos , bem como aos já  formados militares oficiais e graduados temporários, todos  rebaixados a desprezível  posição de  “bichos Cadetes”, os maltratados párias da AMAN. Então, naquele momento impactante, muitos pediram para sair.

      O trauma psíquico prossegue e avulta, somatizando-se para sempre nos corpos e mentes dos jovens Cadetes, inconscientemente,  enquanto são formatados duramente durante os quatro anos acadêmicos sob  constante pressão disciplinar;  tratamento áspero; patrulhamento comportamental;  punições em profusão; mijadas a todo instante;  ameaças de reprovação;  frieza e excessivo rigor dos instrutores;  confinamento   massacrante;  dor da saudade;  vazio existencial;  o silêncio das alamedas, e a frieza dos mármores como companhia nos fins de semana dos laranjeiras. Havia, perceptivelmente, sempre no ar uma temível espada afiada de Dâmocles sobre  jovens cabeças conflitadas.

        Por estas e outras  impagáveis  más lembranças, prezados amigos e camaradas, agora  cônscios de minha assumida, insana  e maldita neurose acadêmica, peço-lhes vênia e compaixão  por me  abster de pisar novamente  naquele tenebroso sítio. Para mim, absolutamente mal são, um ambiente pesado, permeado de fluídos negativos, espaço de tristes lembranças, pleno de desamor, perdas,  mortes precoces,  dores infindas, suor e lágrimas de sangue, mágoas, frustrações e  ressentimentos. Definitivamente, AMAN é o poço de meus ais, dos meus piores tormentos existenciais, insuportável   castelo dos meus horrores e  cruel bastilha de meu corpo, alma e espírito.  Afirmo que nem pela catarse, já tentada,  consegui  me curar dessa maldita neurose.

       Definitivamente, para mim, a AMAN não é um portal sagrado como  a Praia Vermelha, Praia dos Anjos, Jericoacoara, Futuro  ou de Iracema, sítios onde pude e ainda posso me encontrar com meu Deus interior e a paz espiritual, e comungar da raríssima  amizade incondicional com meus eternos e verdadeiros  amigos, e sinceros camaradas  irmãos d’armas.

Salvany  -  Cav/72{jcomments on}